terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A cartola

No bosque antigo, as testemunhas aguardam. Sórdidas, necrófagas, translúcidas como um sudário.
O desafiado chega de mansinho, colete receoso sobre camisa adoentada.
Os duelistas aproximam-se. Lançam um olho de mira à barriga de charuto do juiz. Retiram as pistolas da caixa barroca. Viram-se e chocam costados. O lenço branco cai no chão. Vinte passos e estacam. Rodam calcantes. Imobilizam-se como conservadores de museu. Apontam armas e disparam.
Atarantado, o juiz sacode o fumo e tomba direitinho como laje de jazigo, o sobretudo agasalhando a queda.
Os dois homens aproximam-se do corpo morto. Dois excelentes tiros: um mesmo abaixo da orelha esquerda e o outro no meio da pança.
Apanham do chão a cartola do defunto. Agradecida!
Arrumado o palco do pequeno evento, os quatro homens afastam-se pelo campo florido, discutindo vinhos e petiscos.
Um deles leva na cabeça a aristocrática cobertura. Mesmo à distância, dá para ver que também ela graceja.

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