segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Almas gémeas

Nada tinham em comum, até o camião os apanhar ao mesmo tempo.

domingo, 30 de agosto de 2009

Minnie

Toda a gente viu a Minnie a ser escoltada até à saída da Disneylândia por dois soldados com metralhadoras.
Levava as orelhas e o laçarote carregados de explosivo plástico.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Vice-ssitudes

O Vice-Presidente vice-presidiu. Ninguém o vice-contestou.

Carta de amor de uma romena a um francês

Cher Monsieur,
Je suis sans abri. J´ai deux enfants. Aidez-moi a trouver un travail et a nourrir mes enfants. Vous avez un bon coeur. Que Dieu vous protège et à votre famille.
Alina Piturca

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

As laranjeiras

- Olha as laranjeiras a andar!
Julgou que o amigo estava louco.
No segundo seguinte, foram os dois levados pelas terras.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

A luva

Acordou com uma luva preta na mão direita. Mesmo sem saber como lhe viera parar à mão, achou-a menos estranha do que estranhamente familiar. Era uma luva confortável, feita à sua medida. Uma luva que lhe assentava como uma luva.
Tinha a impressão de já ter visto aquela luva nalgum lado, mas não sabia dizer onde. Até que um dia, de repente, se lembrou: aquela era a luva do Artur Semedo.
Habituou-se de tal modo à luva que nunca a tentou tirar.
Sentia alguma coisa debaixo da luva, dois pequenos corpos esféricos. Mas, temendo a revelação, não quis ver o que era. Preferia que o mistério crescesse e se adensasse.
Quando finalmente ganhou coragem e descalçou a luva, deparou-se com um par de olhos. Só que não era um par de olhos qualquer. O que durante semanas guardara na luva do Artur Semedo era o par de olhos do Abrunhosa.

Traço de união

Tanto o onanista como a mulher solitária liam livros de auto-ajuda.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Velha casa em zona de guerra

Assistira a tanta dor e destruição, que em vez de rachas tinha rugas.

domingo, 23 de agosto de 2009

Walkie-talkies

Antes de deixar o jovem casal aventurar-se na sua labiríntica loja de roupa em segunda mão (que se prolongava por uma extensa galeria subterrânea), o velho dono, confinado a uma cadeira de rodas, entregou-lhes um walkie-talkie declarando, com uma certa gravidade:
- Communication is important.

sábado, 22 de agosto de 2009

Assalto condenado ao fracasso

Para comunicarem um com o outro, os dois surdos-mudos tinham de deixar de apontar as armas.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

O preço da beleza

Depois de beber mais uma taça de ouro potável para prolongar a sua celebrada beleza, Diana de Poitiers, amante de Henrique II de França, pede à aia:
- Tirai-me da gaveta da mesa de nogueira dois kompensans!

A brincar e a ruir

Durante a Primavera de Praga, o brinquedo preferido das crianças checas era uma pequena estátua de Estaline, que os pequenos destruíam com um martelinho e uns minúsculos cabos de aço, vendidos em conjunto com a mini imagem em bronze do ogre russo.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

História medieval

Entre dois jogos de PSP, os dois miúdos discutiam - com a gravidade de medievalistas - se Joana d´Arc teria sido grelhada na brasa ou assada no forno.

Espreitadela

As árvores do parque baixam imperceptivelmente as copas para espreitarem o par que namora dentro do carro.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Teletransporte

Homem de negócios no ramo do import-export, estava condenado a andar de hotel em hotel, longe dos confortos do lar.
Ao fazer a mala, punha sempre um naperon (bordado pela mãe) junto da roupa interior, por cima do retrato dos filhos.
Chegado ao hotel, a primeira coisa que fazia - antes mesmo de experimentar os canais de televisão - era pôr o retrato dos filhos na mesa-de-cabeceira e o naperon no braço do sofá do quarto.
Depois saía para as reuniões agendadas.
Ao voltar ao quarto no fim do dia, cansado do trabalho e do esforço linguístico, punha então em prática o seu expediente para se sentir em casa. Sentava-se no sofá do quarto, fechava os olhos e, no preciso momento em que acariciava o naperon, era teletransportado para a sala de estar de sua casa.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Petróleo

O rapaz-esqueleto pede cinquenta cêntimos para o falso bilhete de autocarro.
- ´brigadinho, senhores doutores... P´ra mim os senhorzinhos também são senhores doutores, sabiam?
A mente, quartel-general da confusão. As pernas, canas frágeis à mercê da ventania. O braço, jazida de petróleo em regime de exploração contínua.
Entre tremores, o rapaz-esqueleto murmura algo de imperceptível. Fecha os olhos e vê um campo de cereal flutuante.
O cartão sujo que segura na desistente mão esquerda diz apenas: Comer.

domingo, 16 de agosto de 2009

Troca

Entregou uma cadeira de rodas e deram-lhe uma tonelada de tampas.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Pastéis de nata

O americano descobriu o pastel de nata em Lisboa. Seis meses depois, não havia festinha de anos nos Estados Unidos que não tivesse pastéis de nata para os meninos esborracharem no nariz uns dos outros.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Lista

- Escova de dentes com ossos;
- Pregos retorcidos com cabeças de sardinha;
- Serradura com limões espremidos;
- Baínhas de calças com Nestum;
- Pernas de bonecos com molho de chanfana...
Coisas que se misturam no lixo.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O beija-flor

O colibri gostava de beijar todas as rosas. Só a rosa mais bela do roseiral lhe recusava o pólen.
Durante horas, o beija-flor bateu as asas à frente dela. Mas a rosa não abria.
Feito para bater asas e beijar rosas, o colibri não desistiu.
Até que, esgotado, caiu sem vida num silvado.
Nesse momento, finalmente pronta para receber o beijo, a rosa abriu.

Olho no cisco

- Que raio de azar! - desabafava o cisco, depois de ter sido atropelado por um olho.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O horror nazi não tinha limites

Em Dachau, os guardas divertiam-se a lançar anões judeus para a boca do hipopótamo de estimação do encarregado do campo.
Na discoteca "Mananita", em Esposende, os anões são lançados à distância pelos clientes mais pujantes.

domingo, 9 de agosto de 2009

Errata dos "Crimes exemplares" de Max Aub

Onde se lê "E foi o fim do mundo" deve ler-se "E foi o fim do mudo".

As pegadas

Acordou na praia deserta, junto às dunas. Olhou para o lado e viu a companheira morta, de barriga aberta.
À frente, um único trilho de pegadas, em direcção ao mar. Seguiu as pegadas até perto da água, onde voltavam para trás.
Intrigado, experimentou colocar o pé direito na pegada direita e constatou - confirmando os seus receios - que se ajustava na perfeição.

Explicação dos animais (VI)

O primeiro crocodilo trincou uma cebola.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Um casal muito velho

O velhote relembra pela tristésima vez que perdeu seis polegares na guerra.
Ao lado, a velhota, antes de entrar no túnel de escuridão mental, tem um último assomo de lucidez:
- Estas veias matam-me!

No recreio

Para assustar as coleguinhas mais queques, a menina estranha saltava à corda com uma cobra.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Os patos bravos

Os patos bravos faziam juz à sua natureza migratória. Todos os verões partiam, em bando, para construir sem licença mais a sul.

Explicação dos animais (V)

A primeira toupeira leu muitos romances à luz da vela.

sábado, 1 de agosto de 2009

Na mó de baixo

O facto de andar sempre na mó de baixo custou-lhe a vida. É que um dia o moleiro não o viu.