quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Provas de amor

Apaixonaram-se num combate de boxe, entre olhares de desafio.
Amavam-se tanto que tinham vontade de se esganar. De se bater como curtidor abrutalhado bate em pele de cordeiro.
Casaram-se um contra o outro, com um padre a arbitrar.
Na arena conjugal, combatiam sem gongo e limite de assaltos. Ela, enqueixando com alegria cotoveladas-relâmpago à hora da sopa. Ele, ansiando com infante comichão a canelada certeira que o córneo pezinho dela tão bem sabia atirar.
Nos dias mais quentes, beliscavam-se à sombra da árvore-chorão em que tinham gravado ameaças de morte com navalhinhas de tortura.
Assim viveram durante anos: feridos, feros e felizes.
Certo Outono, chegaram os arrependimentos: os filhos cujo parto ela deveria ter sofrido, os banhos que não chegaram a dar em afogamento, o Rotweiller que não o mordera com a devida gana…
Ele fez anos em Novembro. Recebeu três chapadões. Em seguida, terrina de Porches (bem robusta, por sinal) no meridiano de Greenwich da nuca.
Derradeiro gesto de amor. Já não lhes deu gozo.
Na semana do Natal, o primo dele começou a tratar dos papéis do divórcio.